12 Abril, 2023 0 comment

O NOVO MUNDO DO TRABALHO

Sumário: Os últimos anos mudaram tudo no mundo do trabalho. Aparentemente de uma só vez, mais pessoas do que nunca começaram a repensar não apenas como e onde trabalham, mas também porque trabalham. Estamos a viver momentos de mudança económica e comportamental sem precedentes, levando a uma redefinição completa na relação entre empregadores e empregados, com expectativas de trabalho mais altas do que nunca.

Booqed

Gig Economy: A ascensão do “trabalho” e o declínio do “emprego”

A ideia de “O homem da organização”, um termo popularizado por William H. Whyte, no seu livro de 1956, que descreve a subordinação do individuo ao serviço de uma grande corporação, está a dar lugar a empreendedores, criadores, freelancers e trabalhadores independentes. Estes, por sua vez, utilizam plataformas digitais para ganhar a vida, alavancando as suas competências e conhecimentos, na ausência de uma relação empregador-empregado tradicional.

Para milhões de pessoas, trabalhar das 9h às 18h para uma única entidade empregadora já não é uma realidade. Em vez disso, equilibram vários fluxos de rendimentos e trabalham de forma independente. Muitas destas mudanças e equilíbrios entre a vida pessoal e profissional devem-se, em parte, à gig economy. Hoje utilizamos uma App para chamar uma viatura, para reservar um apartamento/hotel, encomendar comida, se alguma vez já o fez, então é um gig user.

A ascensão das empresas de plataformas digitais mudou profundamente as regras de emprego. Empresas como a Uber criaram oportunidades de trabalho para cerca de 5 milhões de motoristas, em todo o mundo, sem assinar um único contrato de trabalho de motorista. A economia gig abriu oportunidades para indivíduos e empresas terem acesso a um conjunto diversificado e global de talentos para realizar tarefas, alterando assim muitas das estruturas que sustentavam a segurança do emprego.

De acordo com a OCDE, “globalmente, a maioria dos trabalhadores do gig economy estão satisfeitos com o seu emprego e trabalhar com estas plataformas parece refletir principalmente escolhas voluntárias e não a falta de outras opções”.

Este modelo também conhecido por “business-in-a-box”, assenta em novas plataformas que ampliam o acesso ou criam, potencialmente, um tipo de trabalho totalmente novo, em que as empresas fornecem ferramentas individuais para construir um negócio de propriedade independente. Este é um modelo inerentemente vertical, com exemplos como Dumpling, para empresas de entrega de alimentos e Wonderschool, para creches em casa.

Os desafios para os líderes e organizações  

Perante todas estas mudanças no conceito de “trabalho” e “emprego”, colocam-se novos e complexos desafios aos líderes e ás organizações. Nesse sentido, vale a pena mergulhar no interessante estudo desenvolvido pela Gartner sobre as “As 9 tendências do futuro do trabalho em 2023”. Depois da onda da “demissão silenciosa” (quiet quitting), que teve grande expressão no segundo semestre de 2022  e que significa a existência de colaboradores que se recusam a ir “acima e além” do necessário, fazendo apenas o mínimo exigido nas suas funções, nesta situação e quando colaboradores “desistem silenciosamente”, as organizações mantêm as pessoas, mas estas perdem habilidades e capacidades. De acordo com a Gartner, os líderes deverão virar essa prática ao contrário, com a “contratação silenciosa” (quiet hiring), permitindo aos atuais colaboradores desenvolverem novas habilidades e capacidades sem a necessidade de contratar. Esta nova visão na gestão do talento deverá ser alicerçada nos seguintes pilares: Foco na mobilidade interna do talento para garantir que os colaboradores atendam às prioridades da empresa, sem mudanças no quadro; ampliar e melhorar as oportunidades para os colaboradores existentes, atendendo às necessidades organizacionais em evolução; Abordagens alternativas, como alavancar redes de ex-alunos e trabalhadores temporários, para integrar talentos de forma flexível, apenas quando necessário;

Uma das tendências reveladas tem a ver com as lacunas de competências da Geração Z (aqueles que nasceram a partir da segunda metade da década de 1990), revelando a erosão das suas habilidades sociais e também das organizações no seu todo. O isolamento social causado pela pandemia atingiu, duramente, os jovens: 46% dos colaboradores da Geração Z dizem que a pandemia tornou mais difícil conquistarem os seus objetivos educacionais ou profissionais e 51% dizem que sua educação não os preparou para entrar no mundo trabalho. Estes jovens da Geração Z diminuíram as suas habilidades interpessoais, como negociar, fazer networking, falar com confiança em frente a multidões e desenvolver a resistência social e a atenção necessárias para trabalhar longas horas num ambiente laboral.

Mas não foi apenas a geração Z que sofreu, o decréscimo das competências sociais, que diminuíram de uma forma transversal desde 2020. Burnout, exaustão e insegurança profissional, fatores que se intensificaram durante a pandemia, afetam negativamente o desempenho de colaboradores em todo o mundo.

A necessidade de resultados rápidos

De acordo com o World Economic Forum, perante a necessidade de entregar resultados a curto e médio prazo, muitas empresas estão a mudar a forma de contratar, fazendo-o cada vez mais por competências baseadas na experiência, e menos pelo potencial de desenvolvimento do colaborador. Esta situação levou a um declínio no recrutamento de colaboradores licenciados, muitos empregadores estão a eliminar a formação académica dos seus critérios de contratação, em favor da experiência e competências adquiridas, que permitem obter rápidos resultados. Segundo um estudo da Gallup, apenas 11% dos líderes empresariais “concordam fortemente” que os alunos se estão a formar com as competências necessárias, esta situação tem levado a pedidos de reforma do ensino superior norte americano, onde mais de quatro em cada cinco empregadores acreditam que os estágios podem preparar melhor os recém-licenciados para o sucesso nas suas empresas.

Este é o novo mundo do trabalho, incerto, veloz, cada vez mais digital, global e complexo, quiçá um reflexo de toda uma sociedade que mudou muito rápido nos últimos anos, e perante todas estas mudanças só nos resta um caminho: trabalharmos juntos, com um propósito em mente e a favor de um mundo melhor.

Artigo de Sérgio Almeida, em parceria com o Vida Económica

Download PDF